摘要:Em Diário de Bitita , obra publicada postumamente em 1986, Carolina Maria de Jesus expõe, através de um discurso em tom memorialístico, um passado que pode ser lido como um importante material historiográfico no que se refere à formação cultural brasileira. A narrativa de Carolina Maria de Jesus explora imagens e episódios em que se podem vislumbrar os espaços, deslocamentos e acomodações culturais que o povo negro sofreu desde o período anterior ao advento da República (1889), até os meados do século passado, mais especificamente o período desenvolvimentista (1950) no Brasil. Intui-se que a representação do universo perceptível aventurada na obra de Carolina Maria de Jesus é da ordem da denúncia social. Acredita-se que o fluxo de sua narrativa não registra apenas a trajetória desses indivíduos deslocados em circunstâncias adversas. Na obra a narradora faz várias digressões que remetem ao tempo da escravidão no Brasil. Nessa trajetória se registra a importância de um discurso que, pronunciado por uma voz negra e feminina, se legitima pela força de um sujeito de enunciação que contesta o seu lugar de pertencimento nessa sociedade. No contexto de produção literária em que Carolina se originou percebe-se que, ao se delegar o papel de narrador a uma mulher negra e que se mantinha completamente afastada dos centros legitimadores de produção da época, pode-se projetar, por outras vias de representação, como a sociológica ou a historiográfica, o lugar que o elemento negro alcança nessa sociedade. Para essa análise serão utilizados os pressupostos teóricos de Roberto DaMatta em O Brasil como morada (2003) e Carlos Guilherme Mota em Ideologia da cultura brasileira (2014).