The retextualization of the genre notebook of reality in the Pedagogy of Alternation/A retextualizacao no genero caderno da realidade na Pedagogia da Alternancia.
da Silva, Cicero ; Andrade, Karylleila dos Santos ; Moreira, Flavio 等
Introducao
A Pedagogia da Alternancia (doravante PA), ao longo de sua
caminhada e experiencias desde a criacao das primeiras Maisons
Familiales Rurales (MFR) ou Casas Familiares Rurais (CFR) em 1935 na
Franca (GIMONET, 2007), criou e aperfeicoou, com o proposito de
escolarizar jovens camponeses, diferentes Instrumentos Pedagogicos (IP),
fundamentais ao processo de formacao.
A PA e reconhecida pelos movimentos sociais como uma Pedagogia
propria e apropriada a uma educacao critico-emancipatoria destinada aos
povos do campo. Foi inicialmente praticada no Brasil pelas Escolas
Familias Agricolas (EFA) no final da decada de 1960 (MOREIRA, 2000,
2009). De la para ca, tem se constituido como uma referencia pedagogica
para a formacao nos movimentos sociais. Recentemente, tem fundamentado
tambem cursos de graduacao especificos em Educacao do Campo nas diversas
areas do conhecimento em mais de 40 (quarenta) universidades publicas
brasileiras. Assim, a relevancia impar desta pesquisa esta em analisar
um dos seus IP especificos, como forma de potencializar seu uso, oxala
para alem das praticas em PA aqui analisadas.
Dentre os IP mais importantes da PA, podemos citar o genero Caderno
da Realidade (doravante CR), ao qual restringiremos a analise proposta
neste trabalho. Este artigo faz parte de uma pesquisa mais ampla sobre
os aspectos constitutivos do genero CR e o processo de retextualizacao
dos textos que compoem esse genero (SILVA, 2011). Entretanto, neste
trabalho, a amostra e composta por textos de apenas 01 (um) exemplar do
genero Caderno da Realidade, um instrumento didatico-pedagogico das
unidades educativas que adotam a Pedagogia da Alternancia (PA). Os
textos foram produzidos ao longo do ano letivo de 2009 por 01 (um) aluno
do 9. ano do Ensino Fundamental II, de uma Escola Familia Agricola
(EFA), situada no municipio de Colinas do Tocantins, Estado do
Tocantins.
Veremos, na analise do corpus, que, em grande parte, a dinamica de
producao de seus textos envolve processos de retextualizacao. Para isso,
estabelecemos uma pergunta orientadora para nossa investigacao:
'como se caracteriza o processo de retextualizacao em textos do CR,
considerando que esse e um instrumento pedagogico produzido em um
contexto de ensino, orientado pela Pedagogia da Alternancia?' Para
responder tal questao, procuramos, entao, discutir e situar os processos
de retextualizacao.
O trabalho esta organizado em duas partes principais.
Primeiramente, sao apresentadas algumas concepcoes teoricas relacionadas
aos estudos dos generos discursivos e da retextualizacao, alem de
abordar a metodologia e situar o contexto da pesquisa. Na ultima parte,
considerando a natureza dos eventos linguisticos (KOCH, 2009) que
orientam as atividades de producao escrita dos textos que compoem o CR,
buscamos identificar e caracterizar os textos produzidos a partir de
processos de retextualizacao (DELL'ISOLA, 2007; MARCUSCHI, 2007),
bem como as praticas pedagogicas demandadas. Para finalizar, sao
apresentadas algumas consideracoes sobre os resultados da pesquisa.
Aporte teorico
Os generos (orais ou escritos), por estarem presentes e
desempenharem papel importante em qualquer evento discursivo, apresentam
caracteristicas que pressupoem organizacao das informacoes linguisticas
conforme a finalidade do texto, o papel dos interlocutores e as
caracteristicas da situacao de enunciacao. Aprendemos a utilizar os
generos da mesma forma que aprendemos a usar o codigo linguistico, ou
seja, reconhecendo intuitivamente o que e semelhante e o que e diferente
nos diversos textos.
Pelo fato de a pesquisa focalizar na analise diferentes textos
materializados no genero Caderno da Realidade (SILVA, 2011), torna-se
fundamental o estudo do genero de tais textos para a sua compreensao.
Orientados pela concepcao dialogica da linguagem, tomaremos
'genero' numa perspectiva bakhtiniana. Conforme postulado por
Bakhtin (2006, p. 262, grifo do autor), os 'generos do
discurso' sao "[...] 'tipos relativamente estaveis
de' enunciados". Ainda segundo o autor, os generos do discurso
apresentam tres elementos basicos: conteudo tematico, estilo linguistico
e construcao composicional. Nesse sentido, sao elementos pertencentes a
atividades de linguagem, os quais estabelecem as praticas sociais. De
certo modo, sao 'relativamente estaveis', pois atendem as
especificidades de comunicacao de cada esfera quando se faz uso da
linguagem. Por exemplo, o uso da linguagem nas atividades da esfera
academica e primordial, sendo que constantemente seus atores recorrem a
composicao de enunciados (orais ou escritos) especificos para executar
suas atividades ou expressar suas ideias.
Bakhtin (2006, p. 282) lembra, ainda, que a "[...] diversidade
dos generos do discurso e infinita [...]" e ocorre em funcao da
abundancia de formas da atividade humana. Em outras palavras, podemos
afirmar que e atraves dos processos sociais ou de interacao verbal que
os generos sao originados. Ou seja, sao as esferas que dao origem aos
generos. A escola, a familia, o sindicato, por exemplo, enquanto espacos
ou esferas de convivencia de atores sociais, oferecem a possibilidade de
composicao e disseminacao de generos do discurso para atender as suas
demandas tipicas.
E preciso entender que, a depender das intencoes de seus atores,
objetivos de ensino e da metodologia adotada, cada escola podera
favorecer ou ampliar o ensino a partir de generos 'impares',
as vezes, ate desconhecidos do circulo das praticas de ensino mais
conservadoras, como e o caso do genero Caderno da Realidade (CR) na PA.
E isso se deve tambem ao fato de que "[...] os generos tipificam
muitas coisas alem da forma textual. Sao parte do modo como os seres
humanos dao forma as atividades sociais. [...]" (BAZERMAN, 2009, p.
31). Na escola ou em qualquer outra esfera, as praticas sociais sao
desenvolvidas por meio das praticas de linguagem, e os generos tem papel
fundamental nesse processo.
Cabe-nos ressaltar que, numa perspectiva sociohistorica e dialogica
(BAKHTIN, 2006), como estamos defendendo neste trabalho, o Caderno da
Realidade e um genero que possibilita sistematizar e organizar os
conhecimentos escolares em seus textos segundo a realidade das praticas
educativas empreendidas nos Centros Familiares de Formacao em
Alternancia (CEFFA (1)). Para ele existir, sao necessarias diferentes
atividades de linguagem empreendidas em diferentes esferas, como na
escolar, na familiar e na comunidade. Por isso, a importancia da
abordagem discursiva, destacando-o como um instrumento pedagogico
essencial da PA, uma vez que reflete as varias tradicoes da educacao em
regime de alternancia, as inovacoes no ensino a partir da realidade do
campo, a interacao nessa esfera social etc. E a retextualizacao e uma
atividade que faz parte da sua construcao.
Retextualizacao
O estudo dos generos discursivos, alem da estrutura, da circulacao
na sociedade, entre outros elementos, tambem deve abordar aspectos do
modo de producao. A passagem ou transformacao de um texto falado em
texto escrito ou vice-versa, em nosso cotidiano, e uma atividade
bastante recorrente. Segundo Marcuschi (2007), esse processo e
denominado 'retextualizacao' (2). Na sequencia, apresentamos
os quatro tipos mais comuns ou possibilidades de retextualizacao quando
operamos com certos generos (Figura 1).
Figura 1. Possibilidades de retextualizacao.
Possibilidades de Retextualizacao
1. Fala Escrita (entrevista oral entrevista impressa)
2. Faia Fala (conferencia traducao simultanea)
3. EscritaFala (texto escrito exposicao oral)
4. Escrita Escrita (texto escrito resumo escrito)
Fonte: Adaptado de Marcuschi (2007, p. 48).
O autor lembra que a retextualizacao nao pode ser compreendida como
um processo mecanico, ja que, em nossas atividades comunicativas, e
frequente depararmos com reformulacoes dos mesmos textos, envolvendo
variacao de registros, generos discursivos, niveis linguisticos e
estilos. Cabe salientar tambem que
[...] toda vez que repetimos ou relatamos o que alguem disse, ate
mesmo quando produzimos as supostas citacoes ipsis verbis, estamos
transformando, reformulando, recriando e modificando uma fala em outra
(MARCUSCHI, 2007, p. 48).
Todas essas atividades sao retextualizacoes. Portanto, sao
atividades rotineiras que se realizam de diversas maneiras em diferentes
esferas de nossa sociedade, o que significa dizer que nao ocorrem apenas
na sala de aula. Por exemplo, quando uma secretaria recebe uma chamada
telefonica e produz um 'recado escrito'; um escrivao registra
por escrito a 'tomada de depoimento' durante uma audiencia; um
relator participa de uma reuniao e lavra a 'ata', podemos
dizer que, em todos esses eventos linguisticos, um texto oral foi
retextualizado em um texto escrito. Esses mesmos generos podem ser
transformados em outros: o 'recado escrito' pode ser
transformado em um 'aviso escrito'; as decisoes tomadas na
reuniao e registradas na 'ata' podem ser transformadas em um
'manifesto escrito' do grupo, caracterizando a retextualizacao
de texto escrito para texto escrito. O seguinte esquema (Figura 2)
ilustra, segundo cada R, uma operacao diferente de retextualizacao.
[FIGURE 2 OMITTED]
O R1 traz a passagem da fala para escrita; o R2 exemplifica a
transformacao da escrita para escrita; o R3, passagem da escrita para a
fala; em R4 e R5, acontece a transformacao da fala para a fala. Como
podemos observar, todas as atividades de retextualizacao apresentadas no
esquema sao bastante comuns em nosso dia a dia. Na concepcao de
Dell'Isola (2007, p. 10), a retextualizacao e o
[...] processo de transformacao de uma modalidade
textual em outra, ou seja, trata-se de uma refaccao e
reescrita de um texto para outro, processo que
envolve operacoes que evidenciam o funcionamento
social da linguagem.
Depreendemos que a 'refaccao' e a 'reescrita'
sao atividades fundamentais nas operacoes de retextualizacao de
diferentes generos.
Para Fiad (2009, p. 9), reescrita
[...] refere-se principalmente ao conjunto de
modificacoes escriturais pelas quais diversos estados
do texto constituem as sequencias recuperaveis
visando um texto terminal.
Ou seja, envolve aspectos enunciativos gerais e processos
individuais, o que ajuda a caracterizar os alunos em seus diferentes
percursos formativos, em especial sobre a aprendizagem da escrita. E uma
atividade que envolve participacao do professor ou de outra pessoa. Tal
como explicitado por Goncalves (2009, p. 21), "[...] a reescrita e
parte integrante da atividade escrita". Trata-se dos aspectos
relacionados as mudancas de um texto no seu interior, isto e, uma
escrita para outra, reescrevendo o mesmo texto. Em se tratando de
generos produzidos pelo aluno, com o objetivo de torna-los (mais)
adequados a situacao de interacao prevista para seu funcionamento,
entendemos que essas atividades podem envolver apenas o aluno (refaccao)
ou a participacao do professor (reescrita). Em sintese, a
retextualizacao e um processo que requer a passagem de 'um texto
para outro', de 'um genero para outro', em
'modalidades' diferentes, tal como estabelece Marcuschi
(2007).
Na esfera escolar ou em qualquer outra, a retextualizacao de um
genero (oral ou escrito) exige basicamente: a) compreensao sobre o
genero original e o que esta sendo retextualizado; b) consideracao a
respeito dos diversos aspectos dos generos, como condicoes de producao,
funcao social e propriedades; c) manutencao de tracos que identifiquem o
genero retextualizado. Podemos afirmar, entao, que e um processo que
ultrapassa as questoes meramente linguisticas, pois requer a adequacao
do texto a determinada situacao comunicativa, ao estilo e ao genero
discursivo em uma atividade interativa envolvendo professor e aluno. Nas
retextualizacoes em foco, ou corpus da pesquisa, serao tratadas as
transformacoes de generos escritos, a transposicao do conteudo de um
texto para outro, bem como a mudanca de genero.
Aspectos metodologicos do estudo
A abordagem do objeto de estudo parte de uma revisao bibliografica,
sendo a pesquisa de base epistemologica qualitativo-interpretativista,
com procedimentos de coleta documental de dados (FLICK, 2009; GIL,
1999). Embora faca parte de uma pesquisa mais ampla (SILVA, 2011), o
corpus e constituido por textos de apenas 01 (um) Caderno da Realidade,
um instrumento didatico-pedagogico das unidades educativas que adotam os
principios teorico-metodologicos da Pedagogia da Alternancia (GIMONET,
2007; GARCIA-MARIRRODRIGA; PUIG, 2010). Os textos foram produzidos ao
longo do ano letivo de 2009 por 01 (um) aluno do 9. ano do Ensino
Fundamental II, de uma Escola Familia Agricola (EFA), situada no
municipio de Colinas do Tocantins, Estado do Tocantins.
Neste estudo, nao tivemos participacao alguma na geracao dos dados
da amostra, tais como coordenar atividades ou orientar o aluno (autor
dos textos) durante a producao dos textos. Nos apenas coletamos
documentos. Desse modo, como nossa pesquisa e de cunho documental, nao
foi possivel verificar in loco as dimensoes metodologicas ou etapas que
envolveram a escrita e o processo de retextualizacao de generos do
corpus em sala de aula. Discutiremos as operacoes de retextualizacao de
uma forma geral, mais especificamente a transformacao de um texto
escrito para outro texto escrito, de um genero para outro genero, como e
o caso da Pesquisa do PE para Colocacao em Comum, da Colocacao em Comum
para Sintese do PE e da Sintese do PE para Conclusao e Avaliacao do PE.
Do ponto de vista da analise, nossa interpretacao sobre a
metodologia de producao escrita dos textos que compoem o CR tem como
referencia tres aspectos: 1) nossas experiencias pedagogicas acumuladas
ao longo de quase dois anos na PA, como 'monitor' (3)
(docente) de uma EFA; 2) compreensao do percurso (da primeira a ultima
etapa) de estudo ou aplicacao de um Plano de Estudo (4) (PE); 3)
reflexoes sobre os elementos e as caracteristicas gerais de cada uma das
secoes de registros dos temas dos PE no CR de uma EFA.
Os exemplos de retextualizacao no CR que apresentaremos na
sequencia sao denominados textos 1, 2, 3 e 5. Esses textos foram cedidos
gentilmente pelo autor (menor de idade) com autorizacao formal dos pais,
conforme protocolo de pesquisa (TCLE). Por isso, optamos por omitir os
dados do informante (e tambem do monitor), em especial o nome.
A retextualizacao no Caderno da Realidade
Enquanto genero discursivo, o CR incorpora e reelabora, em suas
secoes, diversos generos, denominados, a partir de agora, 'Pesquisa
do PE', 'Colocacao em Comum', 'Sintese do PE',
'Conclusao e Avaliacao do PE'.
O CR, formado a partir desse conjunto de textos, adquire um carater
especial, tal como o genero do discurso 'livro didatico'
(BUNZEN, 2005). Considerando sua natureza, o processo de sua construcao
a partir de temas dos PE, embora incorpore varios generos, tomamos o CR
como genero discursivo, e nao como um 'suporte' de generos. De
acordo com Marcuschi (2008, p. 174), "[...] suporte de um genero e
uma superficie fisica em formato especifico que suporta, fixa e mostra
um texto". Um jornal, uma revista exemplificam muito bem o que e um
suporte. Para esse autor, o dicionario seria um genero, e nao um
suporte. E importante salientar ao leitor que a caracterizacao de cada
uma das partes ou generos do CR sera realizada ao longo desta parte do
artigo.
Da Pesquisa do PE para Colocacao em Comum
A Pesquisa do PE e um genero de grande importancia para a
constituicao do CR na PA, principalmente pelo fato de instigar o jovem a
fazer questionamentos, a desenvolver uma pesquisa sobre o tema de um PE
na comunidade em que vive. Durante a preparacao (no Tempo Escola) de
saida dos jovens do CEFFA para o meio familiar/propriedade, ocorre a
escolha de um tema do PE (por monitores e alunos) a ser estudado durante
o Tempo Comunidade (5). Como animador do processo, o monitor prepara
(elabora) com os jovens um 'conjunto de questoes' sobre o tema
do PE a ser aplicado na comunidade. Esse genero tem como objetivo
registrar o 'depoimento' de um ator da comunidade que tenha
suas atividades ligadas ao tema do PE em estudo atraves de
'sequencias injuntivas' (questoes/perguntas), podendo o
entrevistado ser os pais do aluno ou outras pessoas proximas. Essa
condicao se estabelece para que alguem possa responder as questoes, alem
de dar mais veracidade sobre a realidade do tema na comunidade do aluno,
ja que o jovem precisa ampliar seus conhecimentos acerca da comunidade,
da familia, da propria realidade em que esta inserido.
Por sua vez, o dialogismo e um aspecto importante da Pesquisa do
PE, pois a composicao desse genero permite a manifestacao de muitas
vozes sociais, como a do proprio jovem alternante (aluno) na elaboracao
'das questoes e respostas', do monitor na elaboracao das
'questoes' e 'intervencoes realizadas durante a producao
escrita', dos pais, de parceiros da sala de sala e de entrevistados
da comunidade nas 'respostas produzidas'. Por isso, devemos
concordar com Bakhtin (2006, p. 279) quando diz que "[...] a obra e
um elo na cadeia da comunicacao discursiva". Ou seja, e o elemento
que permite o dialogismo. Certamente, a Pesquisa do PE e a parte do CR
mais representativa das praticas discursivas no referido genero. Sem a
interacao e a participacao de cada um desses atores, entendemos que a
execucao de um PE nao seria possivel, o que inviabilizaria a producao de
textos para registros no CR. Alem dos varios atores que participam, sua
construcao envolve diferentes situacoes de interacao comunicativa nos
tempos escola e comunidade.
Considerando que a Pesquisa do PE e um genero apoiado em
'sequencias injuntivas' (questoes/perguntas) e
'sequencias expositivas' (resposta as questoes/perguntas), as
caracteristicas basicas apresentadas por esse genero se assemelham
aquelas do genero 'entrevista'. Por outro lado, a socializacao
dos resultados da pesquisa no CEFFA com alunos e monitores permite
discutir aspectos da vida pessoal, social e profissional dos
entrevistados das comunidades relacionados ao tema em estudo.
Alem disso, o questionario Pesquisa do PE e bastante representativo
da diversidade de eventos linguisticos nas atividades de um CEFFA.
Analisando as capacidades comunicativas mobilizadas na construcao desse
genero, podemos destacar que elas possibilitam o estreitamento das
relacoes sociais entre elementos ou conhecimentos da instituicao escola
e da realidade social desses atores sociais--o lar do entrevistado, a
comunidade, o cotidiano do meio rural etc. Por meio da
'entrevista', o estudo do tema de um PE traz outros aspectos
da vida social e cultural ao alcance do jovem, como o estabelecimento da
relacao entre conhecimento empirico e cientifico, entre cultura popular
e cultura escolar (SILVA, 2011). Ou seja, sao mobilizadas diversas
praticas sociais em diferentes esferas, como 'escola',
'familia' e 'propriedade/comunidade' na construcao
nao so da Pesquisa do PE, mas tambem de outros textos que compoem o CR.
Como veremos no texto 1, as questoes que compoem a Pesquisa do PE
apresentam uma estrutura bastante semelhante. Levando em consideracao
que uma analise pode aduzir diferentes aspectos dos textos, optamos por
aplicar a analise desse texto as seguintes categorias: (1) tipo de
pergunta; (2) marcas de reescrita; (3) apreciacao (6) do monitor; e (4)
aspectos linguisticos.
O texto (7) 1 (Figura 3), traz o questionario Pesquisa do PE
selecionado para analise e tem como tema os 'derivados da
carne'. Ele foi escrito pela 'Informante 1' (8), que era
aluna do 9 ano do Ensino Fundamental da Escola campo (EFA) em 2009. A
producao desse texto foi orientada pelo 'Monitor 1', que e
licenciado em Pedagogia e ja cursou PosGraduacao Lato sensu na area da
PA:
[FIGURE 3 OMITTED]
Observando a estrutura (ou tipologia) das perguntas que compoem o
texto 1, notamos que elas sao introduzidas pelas palavras
'Como', 'Na' e 'Quais'. Das cinco questoes
desse texto, a numero 1 parece exigir do entrevistado um pouco mais de
reflexao e conhecimento sobre o assunto (comercializacao da carne e de
seus derivados) para responde-la. Aparentemente, parece ser uma questao
simples, mas a resposta demanda conhecimentos sobre precos, oferta e
procura da carne no mercado. Como nao foi registrada nenhuma resposta a
questao numero 1, nao podemos afirmar se o entrevistado concedeu ou nao
uma resposta.
Os registros desse texto (1) apresentam perguntas registradas a
caneta e respostas a lapis. Essa observacao esta relacionada ao plano
estetico do texto, embora os registros a lapis nao sejam proibidos.
Apesar de respostas a lapis oferecerem mais possibilidade de reescrita
ate chegar a versao final do texto, isso nao aconteceu. Por exemplo, a
resposta a questao numero 2 e muito breve. Esta e as demais respostas
nao retomam os enunciados das respectivas perguntas, trazendo apenas
informacoes basicas. Como leitor, entendemos que ha um grande paradoxo
no texto 1: de um lado, apresenta respostas que exigem reescrita; de
outro, bordas desenhadas para ilustrar o aspecto visual do texto.
Considerando que a informante teve um monitor responsavel pelas
orientacoes e intervencoes durante a producao escrita dos textos do CR,
como e o caso do genero Pesquisa do PE, espera-se que tais contribuicoes
ajudem-na a melhorar o nivel dos textos produzidos. Em relacao ao papel
desempenhado pelo monitor durante a producao escrita do texto 1, o
original mostra que parece nao terem acontecido intervencoes
satisfatorias. O monitor se limitou a inserir seu 'visto' no
rodape e na parte superior esquerda (apagamos o visto para evitar
identificacao) do texto, apesar das inadequacoes suscitadas.
No que diz respeito a pontuacao, as questoes numeros 3, 4 e 5 nao
trazem o ponto de interrogacao, o que e fundamental em qualquer
pergunta. Alem disso, tais questoes apresentam inadequacoes nao so na
sua elaboracao, mas tambem nas respectivas respostas, pois algumas
palavras nao tem conexao, como, por exemplo, 'mais e' no
interior da resposta a questao numero 3 e 'o lucro' a numero
4. Ainda na questao numero 3, aparece a conjuncao 'e' em lugar
do verbo de ligacao 'e'. Entendemos que nao se trata apenas do
simples fato de a autora do texto ter omitido o acento agudo do
'e', pois isso se repete ao longo dos textos do CR. Como
mostra o texto 1, tais inadequacoes interferem na producao escrita. Ao
implementar a reescrita nos CEFFA, essas e outras inadequacoes poderiam
ser resolvidas, o que ajudaria os alunos a refletirem sobre os proprios
textos que escrevem e melhorarem a producao final dos CR (SILVA;
ANDRADE, 2014). Analisaremos, na secao seguinte, o genero Colocacao em
Comum.
Analise a Colocacao em Comum
A fim de aprofundar nossa analise sobre a escrita de textos que
constituem o genero CR, discutiremos, a partir de agora, a
retextualizacao do genero Pesquisa do PE para o genero Colocacao em
Comum presente na amostra. Sao transformacoes de generos escritos,
decorrentes da transposicao do conteudo de um texto para outro, bem como
a mudanca de genero (DELL'ISOLA, 2007).
A Colocacao em Comum, enquanto instrumento pedagogico da PA,
apresenta-se de duas formas nas atividades dos CEFFA: 'oral'
ou 'escrita'. Quando o jovem retorna do tempo comunidade (meio
familiar/propriedade), ele traz os resultados da pesquisa que realizou
sobre o tema de um PE, com o questionario Pesquisa do PE respondido.
Apos a equipe de monitores apreciar o trabalho de cada jovem,
individualmente, ocorre a Colocacao em Comum na modalidade oral em sala
de aula. Este e um momento fundamental para socializacao dos resultados
da pesquisa do PE e aprofundamento das discussoes sobre o tema estudado
nas comunidades pelos jovens. Durante as socializacoes, dependendo da
importancia do assunto para a comunidade e dos resultados apresentados,
o monitor e os jovens podem planejar uma 'intervencao
externa'. Como nossa pesquisa contempla apenas textos escritos
registrados nos CR, nao abordaremos na analise a Colocacao em Comum na
modalidade oral.
Para os registros escritos do CR, a Colocacao em Comum e um genero
em que o jovem apresenta uma especie de 'relato', baseado na
pesquisa realizada na comunidade sobre o tema de um PE. Podemos afirmar
que seu objetivo e intermediar a socializacao, na modalidade escrita da
lingua no CR, da experiencia e das informacoes coletadas sobre o tema
(do PE) estudado. Por isso, predominam, na Colocacao em Comum, as
'sequencias expositivas'. Portanto, cabe ao jovem o desafio de
transpor o conteudo da Pesquisa do PE para Colocacao em Comum.
Apresentamos na sequencia o texto 2 (Figura 4), que e uma
retextualizacao do texto 1, isto e, do genero Pesquisa do PE para o
genero Colocacao em Comum no CR. Ambos foram escritos pela Informante 1
sob orientacao do Monitor 1:
[FIGURE 4 OMITTED]
O genero Colocacao em Comum tem o papel de materializar e
socializar, por meio de um texto expositivo, o relato das experiencias
do jovem relacionadas ao estudo e a pesquisa sobre o tema de um PE na
comunidade em que vive. E o texto 2 (Colocacao em Comum) consegue
atender esse objetivo. Considerando que a retextualizacao e uma
atividade que leva em conta, em alguns de seus aspectos, a transposicao
do conteudo de um texto para outro, a adequacao do texto a estrutura do
novo genero, a autora consegue atingir isso. E possivel notar diferencas
pontuais na composicao dos textos 1 e 2. Enquanto o texto 1 e
constituido de perguntas e respostas, o texto 2 (retextualizado)
reelabora tais respostas em paragrafos.
Quando a autora afirma, no primeiro paragrafo (do texto 2), que:
"[...] com as aulas que tivemos em sala debatendo sobre os
derivados da carne nos os alunos chegamos a conclusao [...]", ela
nos leva a depreender que houve interacao na construcao desse texto do
CR e socializacao de experiencias. Por si so, o emprego do verbo
'debater' e dos verbos na primeira pessoa do plural
('tivemos, chegamos') evidencia o dialogo, marca a interacao
com outro, seja esse outro o aluno ou o monitor. No segundo paragrafo,
ela adiciona uma resposta nao registrada na questao numero 1 do texto 1,
mas que e coerente com o tema estudado. Por sua vez, o terceiro
paragrafo (texto 2) amplia a resposta da segunda questao do texto 1, ou
seja, alem de armazenar na geladeira, 'colocar' a carne ao sol
ou 'fazer' derivados tambem sao opcoes de conservacao.
Se na resposta numero 3 do texto 1 (Pesquisa do PE) a finalidade
dos derivados da carne limita-se ao 'proprio consumo' da
familia, ao retextualizar essa resposta, no quarto paragrafo do texto 2,
a autora afirma agora que a "[...] finalidade e agregar valores,
'da' novos sabores, conservacao e fonte de renda". E uma
mudanca significativa no plano semanticopragmatico do texto, deixando
clara a ideia de que a carne so e produzida para a comercializacao. Alem
disso, ao final do texto 2, sao citados alguns derivados da carne
('carne de sol, defumados, linguica, bolinho de carne'), os
quais nao estao presentes nas respostas as questoes do texto 1.
Mais uma vez, o ultimo paragrafo do texto 2 corrobora a tese de que
os textos do CR sao construidos coletivamente, permeados de diferentes
vozes em sua composicao, como afirma a autora:
[...] com as ideias de cada um aluno, conhecemos varias formas de
conservacao como: fazer defumados, fazer derivados, colocar no sol,
na geladeira, fazer linguica, bolinho de carne e outros.
Tal conhecimento so foi possivel porque cada um dos alunos aplicou
o questionario Pesquisa do PE (texto 1) na sua comunidade, socializando
posteriormente os resultados em sala de aula por meio da Colocacao em
Comum. Sem isso, talvez a autora nao tivesse conseguido ter nocao de
quais sao ou o que seriam derivados da carne.
Analisando a estrutura do texto 2, podemos observar que ele e
organizado em paragrafos, embora nao apresente conectivos para articular
suas sequencias e ideias. Quando empregados adequadamente, os conectivos
sao elementos importantes para o estabelecimento da coerencia ao texto.
Por mais que o texto 2 apresente inadequacoes relacionadas a ortografia,
a coesao, a pontuacao, principalmente, a autora consegue expressar suas
ideias de forma coerente com o tema da pesquisa do PE. Tais inadequacoes
podem ser resolvidas com intervencoes adequadas do monitor durante a
producao escrita ou processo de retextualizacao dos generos, o que vai
refletir de forma positiva no letramento do aluno.
Por outro lado, embora tenham sido desenhados pequenos coracoes na
margem superior do texto 2 para ilustrar e demonstrar
'capricho', o texto verbal apresenta caracteristicas de
rascunho, pois a primeira frase esta rasurada, alem de inadequacoes no
plano linguistico ja discutidas. Apesar da melhora nessa
retextualizacao, ainda sao necessarios ajustes, reescrita na versao
final para atender as condicoes de producao de um genero. As
inadequacoes em um texto nem sempre estao relacionadas a falta de
habilidade individual de um aluno (GONCALVES, 2009), mas sim a falta de
atividades de leitura, de analise linguistica e a intervencoes
inadequadas do docente (cf. SILVA; ANDRADE, 2014).
Se o CR apresenta caracteristica de genero discursivo, como podemos
depreender com seus objetivos dentro da proposta da PA, em especial
quando propoe a formacao integral (GARCIAMARIRRODRIGA; PUIG, 2010) dos
jovens camponeses, as funcoes do monitor vao muito alem do
acompanhamento apenas para pontuar as atividades que o aluno fez ou
deixou de fazer. De qualquer forma, em funcao de a nossa pesquisa tomar
como fonte de dados apenas documentos, e nao as dimensoes metodologicas
ou os processos de construcao dos respectivos textos que compoem o CR do
corpus, torna-se delicado estabelecer outras observacoes ou conjecturas
acerca das orientacoes sobre a producao escrita. Talvez, uma
pesquisa-acao pudesse oferecer elementos necessarios e adequados a
investigacao. Na seguinte secao, analisaremos outros textos do CR que
tambem apresentam retextualizacoes.
Da Colocacao em Comum para Sintese do PE
Como ja discorremos sobre a constituicao do genero Colocacao em
Comum, explicitando seus objetivos, sua estrutura, nao o retomaremos
aqui. Nosso proposito nesta secao e analisar uma retextualizacao do
genero Colocacao em Comum para Sintese do PE (Texto 3).
A Sintese do PE constitui um dos textos mais importantes entre os
registros de um PE no CR. Trata-se de um genero que tem como objetivo
apresentar uma sintese pessoal elaborada pelo jovem sobre as atividades
relacionadas ao tema de um PE, as respostas do questionario Pesquisa do
PE, a Colocacao em Comum e suas experiencias cotidianas no tempo
comunidade (familiar/propriedade). A Sintese do PE e um texto que deve
abordar questoes teoricas e experiencias cotidianas contempladas pelo
estudo do PE. E um genero que favorece a discussao de aspectos da
realidade, do conhecimento de mundo dos alunos e das informacoes que
eles detem sobre os temas dos PE. Logo, a construcao desse genero exige
competencia discursiva (BRASIL, 1998-2001) por parte dos jovens
aprendizes, sobretudo para articular as informacoes e compor um genero
segundo as condicoes de producao.
Entendemos que a Sintese do PE parece oferecer mais liberdade aos
autores (alunos) na sua composicao do que outros generos que constituem
o CR. Para elaborar a Sintese do PE, o jovem (aluno) precisa fazer
reflexoes e retomar todas as atividades desenvolvidas durante as duas
primeiras etapas de estudo do tema de um PE (Pesquisa do PE e Colocacao
em Comum). Por sua vez, os resultados da pesquisa do tema do PE na
comunidade sao fundamentais na construcao desse genero. Com isso,
podemos afirmar que a Sintese do PE e caracterizada por um estilo livre,
aparentemente impessoal, constituindo um texto em que predominam
'sequencias expositivas'. Alem disso, exige dos autores o
emprego de uma linguagem objetiva, para tornar a comunicacao mais
eficiente.
Para analisar o texto 3, estabelecemos alguns criterios,
considerados bastante relevantes para o estudo, tais como: (1) Aspectos
linguisticos (sintatico e semantico); (2) Fatores pragmaticos; (3)
Paragrafacao; e (4) Intervencao do monitor. Considerando que esses
criterios serao aludidos de forma implicita ao longo das analises, cabe
ao leitor inferi-los em cada um dos paragrafos.
Para dar sequencia a nossa discussao sobre o processo de
retextualizacao em textos do genero CR, apresentamos o texto 3 (Sintese
do PE) (Figura 5), que e uma retextualizacao do texto 2 (Colocacao em
Comum). Conforme explicitado, esses textos foram produzidos pela
Informante 1 na Escola campo (EFA). A autora foi orientada pelo Monitor
1:
Apesar de ser escrito a partir da retextualizacao, o texto 3
(Sintese do PE) apresenta bastantes inadequacoes em seu aspecto
linguistico. Na ortografia, ha palavras rasuradas e outras registradas
incorretamente ('conzida' em vez de 'cozida',
paragrafo 3) ou faltando alguma letra. Podemos citar ainda inadequacoes
na concordancia do paragrafo 4, entre outras bastante visiveis. A
pontuacao do texto, como no caso do paragrafo 5, precisa ser revista.
Embora seja usado com pouca frequencia, a aluna emprega corretamente os
dois pontos no interior do paragrafo 3. Alem disso, ela introduz a
primeira palavra de cada um dos paragrafos com letra maiuscula, o que
nao e comum em outros textos do corpus. De modo geral, sao questoes
ligadas diretamente a textualizacao, o que pode gerar dificuldades na
compreensao do texto por parte do leitor.
[FIGURE 5 OMITTED]
Observando outros aspectos do texto 3 (Sintese do PE), notamos que
a autora inicia o primeiro paragrafo com a expressao 'os derivados
da carne' (o tema gerador do PE), sendo repetida nos paragrafos
terceiro e quarto. Certamente, se realizadas releituras e reescrita, as
informacoes desses tres paragrafos poderiam ser condensadas em apenas
um. Isso traria mais objetividade em relacao as informacoes do texto
retextualizado. Alem disso, as informacoes sobre a 'conservacao da
carne' poderiam ser apresentadas em um unico paragrafo. No entanto,
aparecem distribuidas nos paragrafos primeiro, segundo e terceiro, o que
reforca a necessidade de reescrita do texto por parte da autora sob
orientacao do monitor. Nos paragrafos quinto e sexto, podemos destacar
um aspecto bastante positivo: a autora introduz informacoes que nao
estao presentes no texto 2 ('original'). Ou seja, sao
inseridas novas informacoes sobre o tema do PE, especificamente sobre a
'higiene' durante o processo de manipulacao da carne para
comercializacao. Evidentemente, essa informacao esta relacionada a
possiveis conteudos do topico numero 1, do texto 2 (Colocacao em Comum).
O fato de a ordem das informacoes ou dos conteudos nao ser a mesma do
texto original nao descaracteriza a retextualizacao. Alias, e sinal de
criatividade por parte da aluna, demonstrando tambem que ela incorporou
informacoes que obteve durante a fase de construcao da Colocacao em
Comum.
Tal como sao apresentadas as informacoes no texto 2
('original'), o texto 3 e organizado em paragrafos. Por sua
vez, a exposicao nao se apresenta melhor porque ainda predominam
periodos soltos, com a presenca de poucos articuladores. Como a autora
faz uso limitado dos recursos linguisticos na construcao do seu texto
(3), podemos notar uma pequena evolucao em relacao ao texto 2.
De modo geral, as inadequacoes presentes no texto 3 poderiam ser
sanadas com a verificacao, observacoes e intervencoes adequadas do
monitor durante o processo de producao (SILVA; ANDRADE, 2014). Isso
possibilitaria ao aluno a realizacao de uma producao escrita reflexiva.
Tal como mencionado em outros textos, as intervencoes do monitor se
resumiram a insercao de um visto na parte superior (esquerda) do texto e
outro no rodape do texto. O texto ainda sugere que sejam trabalhadas
especificidades da modalidade escrita da lingua com a aluna. Mas,
independentemente dessas inadequacoes, o texto 3 e uma retextualizacao
do texto 2, embora demonstre um nivel menos elaborado.
Na proxima secao, analisaremos o processo de retextualizacao do
genero Sintese do PE para Conclusao e Avaliacao do PE no CR. A analise
tambem tera como referencia os seguintes criterios: (1) Aspectos
linguisticos (sintatico e semantico); (2) Fatores pragmaticos; (3)
Paragrafacao; e (4) Intervencao do monitor.
Da Sintese do PE para Conclusao e Avaliacao do PE
Considerando que ja realizamos a caracterizacao do genero Sintese
do PE no CR, explicitando seus objetivos, sua estrutura, dentre outros
elementos, nao o retomaremos aqui. Nesta secao, o intuito e analisar uma
retextualizacao do genero Sintese do PE para o genero Conclusao e
Avaliacao do PE.
A Conclusao e Avaliacao do PE e o genero que aparece na ultima
secao (quinta) de registros de um PE no CR. Constitui um espaco
reservado as reflexoes finais do jovem alternante sobre o tema (PE)
estudado. De modo geral, podemos afirmar que o objetivo desse genero e
registrar consideracoes, reflexoes, pontos positivos e negativos do
jovem (aluno) sobre o tema do PE estudado (desenvolvido) no tempo escola
(CEFFA) e no tempo comunidade (familiar/propriedade), bem como pontuar a
importancia do estudo para sua realidade socioprofissional.
De certa forma, ao construir o genero Conclusao e Avaliacao do PE,
os jovens devem contemplar as atividades e/ou informacoes consideradas
mais significativas relacionadas ao estudo do tema de um PE, suas
experiencias cotidianas, em especial o conteudo do genero Sintese do PE.
E essa passagem ou transposicao do conteudo de um genero para outro
envolve diretamente a retextualizacao.
Tendo em vista que a Conclusao e Avaliacao do PE e constituida de:
'consideracoes, reflexoes, pontos positivos e negativos', a
natureza desses elementos nos permite afirmar que e um genero
constituido basicamente por uma sintese, em um primeiro momento pessoal,
mas depois no texto ela incorpora uma compreensao mais ampla, ou seja,
coletiva. Por isso, e um texto em que predominam 'sequencias
expositivas'. Trata-se, portanto, de um texto de estilo pessoal e
de cunho avaliativo. Por ser uma sintese expositiva, o(a) autor(a) tem
liberdade para fazer julgamento, emitir suas consideracoes, avaliar o
desenvolvimento do estudo e ate mesmo apresentar sugestoes por meio dos
pontos negativos em seu texto, desde que mantenha o tema do texto
original, neste caso, a Sintese do PE.
Para finalizar nossa analise ao processo de retextualizacao em
textos do genero CR, apresentamos o texto 5 (Conclusao e Avaliacao do
PE) (Figura 6), que e uma retextualizacao do texto 3 (Sintese do PE). A
autora desses textos tambem e a Informante 1, sendo o Monitor 1
responsavel pelas orientacoes durante o processo de producao escrita de
tais textos:
[FIGURE 6 OMITTED]
Analisando o plano linguistico do texto 5, podemos identificar
algumas inadequacoes, envolvendo, principalmente, pontuacao, inadequacao
vocabular e ortografia. E notorio que a autora ('aluna') do
texto faz uso adequado do ponto, da virgula e dos dois pontos, mas a
virgula deveria ser empregada apos o termo 'bom' e 'da
carne', e o ponto apos 'sabores' no paragrafo 4. Ha
inadequacao vocabular ao empregar 'esta em' em vez de
'.ser de' no paragrafo 2. Em relacao a ortografia, ha palavras
sem acento e outras faltando letras, como e o caso de 'se' em
vez de 'ser' no paragrafo 2. Alem disso, surgem palavras
rasuradas. No ultimo paragrafo, a autora emprega o termo 'bom'
para introduzir sua conclusao; depreende-se que e como se estivesse
dialogando com alguem. Apesar de nao ser um articulador conclusivo, da
maneira como foi empregado ele traz ideia de finalizacao. No geral, as
inadequacoes nao geram problemas de compreensao do texto.
Conforme explicitado, a Conclusao e Avaliacao do PE e um genero
constituido de 'consideracoes', 'reflexoes',
'pontos positivos' e 'negativos' com base no estudo
realizado sobre o tema de determinado PE pelos alunos. Entretanto,
depreende-se que a autora do texto 5 se limita a fazer apenas
consideracoes sobre a finalidade dos derivados da carne, tipos de
derivados mais comuns e a importancia da higiene durante a manipulacao
da carne. Ou seja, nao ha reflexao mais ampla sobre o tema. O texto nao
retoma questoes como comercializacao e conservacao da carne presentes no
texto 3 ('original'). Ainda que limitado e apresentando um
nivel pouco elaborado, a autora conseguiu realizar a retextualizacao.
Embora apresente todas essas inadequacoes, de modo geral, e um texto que
favorece a textualizacao por parte do leitor.
Tal como apresentado no texto 3, a paragrafacao tambem ocorre no
texto 5. Evidentemente, isso favorece a exposicao das ideias de forma
(mais) adequada. E a autora tem nocao da importancia dos paragrafos, de
modo que cada um apresenta certo 'item' do tema principal.
Por ser o genero que 'fecha' o ciclo dos registros de
estudos sobre o tema de determinado PE, entendemos que a Conclusao e
Avaliacao do PE tambem oferece espaco suficiente para que o aprendiz
(aluno) possa, de fato, nao so refletir e avaliar, mas tambem apresentar
sugestoes relevantes para o aperfeicoamento da propria construcao do CR.
Infelizmente, isso nao aconteceu no texto 5.
Consideracoes finais
De modo geral, a analise demonstra que ha uma pequena evolucao no
nivel da retextualizacao do genero Pesquisa do PE (texto 1) para o
genero Colocacao em Comum (texto 2). Por outro lado, a retextualizacao
do genero Colocacao em Comum (texto 2) para o genero Sintese do PE
(texto 3) apresenta um nivel 'mais bem' elaborado, sendo
considerado o texto (mais) adequado ao genero. Ja a retextualizacao do
genero Sintese do PE (texto 3) para o genero Conclusao e Avaliacao do PE
(texto 5) pode ser considerada a que apresenta menor evolucao em relacao
ao nivel dos textos.
Considerando os exemplos apresentados por meio dos textos 1, 2, 3 e
5, podemos afirmar que as atividades de retextualizacao sao rotinas
usuais e altamente importantes nas praticas escritas no contexto da
educacao em alternancia. Talvez os atores envolvidos nem tenham
consciencia disso, mas, como ilustram os textos, o CR concretiza esse
processo, embora ainda de forma incipiente e aberta ao aperfeicoamento.
Por isso mesmo, a producao do genero CR pode ser um instrumento de
grande importancia para o ensino de Lingua Materna nos CEFFA,
especialmente da modalidade escrita.
Mas para que isso ocorra, a producao escrita exige que sejam
estabelecidos parametros metodologicos. Isso permite que as condicoes de
producao e recepcao dos textos sejam outras, gerando bons textos
(retextualizados ou nao). E o aluno, evidentemente, podera melhorar seu
desempenho nas producoes escritas, ampliando, assim, sua capacidade de
escrever. Isso e o que mais nos interessa no estudo da retextualizacao
para o desenvolvimento da escrita do aluno, pensando a construcao do CR
e, de um modo geral, outros textos nos CEFFA.
Portanto, a partir da analise interpretativa, depreende-se que e
fundamental realizar um trabalho mais sistematizado com o referido
genero e as atividades de retextualizacao (DELL'ISOLA, 2007), a fim
de que os alunos possam compreender o processo de construcao do CR e
tambem avancar em suas capacidades de uso da escrita. Como ja
sinalizamos, a reescrita (FIAD, 2009; SILVA; ANDRADE, 2014) pode ser uma
ferramenta importante nas atividades escritas e na retextuzalizacao de
textos do CR nos CEFFA.
Doi: 10.4025/actascilangcult.v37i4.25050
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na Posgraduacao. Palmas: EdUFT, 2014. v. 1, p. 189-206.
Received on September 24, 2014.
Accepted on June 23, 2015.
License information: This is an open-access article distributed
under the terms of the Creative Commons Attribution License, which
permits unrestricted use, distribution, and reproduction in any medium,
provided the original work is properly cited.
Cicero da Silva [1] *, Karylleila dos Santos Andrade [2] e Flavio
Moreira [3] ([dagger])
[1] Fundacao Universidade Federal do Tocantins, Av. Nossa Senhora
de Fatima 1588, 77900-000, Tocantinopolis, Tocantins, Brasil. [2]
Fundacao Universidade Federal do Tocantins, Palmas, Tocantins, Brasil.
[3] Universidade Federal do Espirito Santo, Centro Universitario Norte
do Espirito Santo, Sao Mateus, Espirito Santo, Brasil. ([dagger]) in
memoriam. * Autorpara correspondencia. E-mail:
[email protected]
(1) Compreendem-se as unidades educativas que assumiram o sistema
pedagogico da PA, como as Escolas Familias Agricolas (EFA), as Casas
Familiares Rurais (CFR), dentre outras. Elas tem objetivos comuns,
voltados a formacao de jovens agricultores.
(2) O termo 'retextualizacao' foi empregado por Neusa
Goncalves Travaglia, em 1993, em sua tese de doutorado intitulada A
traducao numa perspectiva textual. Nessa obra, a autora concebe a
traducao de uma lingua para outra enquanto processo de retextualizacao.
A partir desse trabalho, Marcuschi (2007) estabelece outras
possibilidades de retextualizacao.
(3) Nos CEFFA, alguns termos adotados diferem dos conhecidos nas
escolas que oferecem o ensino regular, como por exemplo:
'monitor' = professor; 'jovem' = aluno/estudante;
CEFFa = escola etc. Assim, o 'monitor' nao e o 'detentor
do conhecimento', mas aquele que acompanha, guia, orienta os jovens
em direcao as fontes de conhecimento, aquele que facilita a
aprendizagem. Alem de exercer as atribuicoes pedagogicas de professor, o
monitor tambem exerce outras atividades (inclusive, administrativas) em
um CEFFA (GIMONET, 2007).
(4) Durante um ano letivo, os monitores trabalham com os alunos de
cada uma das series dos CEFFA 08 (oito) Planos de Estudo (PE)
constituidos de tematicas diferentes. E sao os textos resultantes das
pesquisas desenvolvidas e discussoes sobre esse conjunto de temas
(conteudos) dos PE que vao compor os registros do CR.
(5) Por nao ser o foco deste estudo, nao aprofundaremos as
discussoes sobre Tempo Escola (TE) e Tempo Comunidade (TC). Para tanto,
consultar Ribeiro (2008).
(6) Tomamos 'apreciar', considerando as atribuicoes
inerentes ao trabalho do monitor durante o processo de producao escrita
do CR: fazer intervencoes, propor a reescrita, avaliar a producao/versao
final dos textos.
(7) Utilizamos o 'italico' na transcricao do genero
Pesquisa do PE (texto 1) para indicar as respostas apresentadas pelo
aluno as questoes.
(8) Essa Informante 1 e a autora dos textos 1, 2, 3 e 5, todos
produzidos sob orientacao do Monitor 1.
(9) Esse texto foi ilustrado, originalmente, por Silva (2011) como
'Texto 1c Pesquisa do PE'.
(10) Esse texto foi ilustrado, originalmente, por Silva (2011) como
'Texto 2c Colocacao em Comum'.
(11) Esse texto foi ilustrado, originalmente, por Silva (2011) como
'Texto 3c Sintese do PE'.
(12) Esse texto foi ilustrado, originalmente, por Silva (2011) como
'Texto 5c Conclusao e Avaliacao do PE'.